Em ascensão: sete das oito equipes nas quartas de final da copa do mundo são europeias.
Opinião: por Letícia Medeiros
Noruega, Inglaterra, França, Estados Unidos, Itália, Holanda, Alemanha e Suécia. Essas foram as oito equipes que se classificaram para as quartas de final da Copa do Mundo de 2019. Desde então, já sabemos quem irá competir nas semis: de um lado Inglaterra e Estados Unidos, do outro Holanda e Suécia.
Atualmente, a seleção dos Estados Unidos continua sendo a grande favorita ao título. É a única equipe com três conquistas na competição (1991, 1999, 2015), é natural que se espere uma repetição desse feito. No entanto, quem acompanha essa edição da Copa já deve ter percebido que várias seleções apresentaram grandes melhoras em seus níveis técnicos. Afinal, a toda poderosa U.S. Women’s National Soccer Team (USWNT) – pasmem – quase foi eliminada pela Espanha. Mas o que explica essa recente tendência do futebol feminino? Será que já podemos prever uma hegemonia do Velho Continente no futuro da modalidade? Para entender melhor, é necessário fazer uma breve reflexão histórica.
O futebol começou a se tornar popular nos EUA por volta de 1970. Ao contrário de países como Brasil e Inglaterra – vistos como tradicionais no esporte devido ao desempenho masculino – os estadunidenses se esquivam da maior parte do preconceito atrelado à prática feminina. Lembrem-se que, por exemplo, tanto Brasil quanto Inglaterra chegaram a proibir mulheres de jogar futebol.
De certa forma, por não possuir essa bagagem misógina e já terem esportes nacionais definidos – basquete, futebol americano, beisebol – o país abraçou, sem grandes problemas, a prática esportiva do futebol para mulheres e homens. Não quero aqui insinuar que por lá mulheres não sofreram ou sofrem preconceito, que fique claro. Apenas tento demonstrar que comparativamente a situação era diferenciada.
A inclusão do futebol na cartilha da Associação Atlética Universitária nos Estados Unidos permitiu que o esporte fosse incentivado e visto como algo benéfico. Começou a ser trabalhada a ideia de jogar futebol para conseguir uma boa educação de forma gratuita, através de bolsas de estudo concedidas para atletas de destaque. Esse não foi o caso na América Latina ou Europa.
No entanto, desde a chegada do milênio, os avanços sociais conquistados pelas mulheres acabaram por reverberar no futebol. Era uma questão de tempo, se bem que a duração das coisas ainda progride numa lentidão quase estática em alguns lugares.
A União das Associações Europeias de Futebol (UEFA) vem pelos últimos 15 anos investindo sistematicamente no futebol feminino. Tal investimento europeu é presente em todas as fases, desde a criação de associações, programas de liderança no futebol, como também no treinamento de técnicas e jovens jogadoras. O estabelecimento de ligas profissionais é um passo fundamental, pois se assemelha a uma estrutura que já existe. Temos a Liga Iberdrola na Espanha, Superliga Feminina na Inglaterra, Eredivisie na Holanda, Ligue 1 na França, Bundesliga na Alemanha, e por aí vai. E aqui sinto a necessidade de reafirmar que claro, na questão da profissionalização de atletas, ainda há muito o que avançar, mas os primeiros passos foram dados de forma segura.
Times mundialmente reconhecidos, como Real Madrid e Manchester United, finalmente montando equipes, mostra que os países europeus estão usando sua influência e poderio para fomentar a participação feminina no universo do futebol, ainda que de forma tardia. A estrutura que esses clubes podem oferecer para quem não tinha apoio, já faz muita diferença.
Ligas organizadas, treinamentos regulares e acesso a equipe médica, condicionamento físico acompanhado por profissionais qualificados, além da estrutura física disponível. Esse cuidado permite construir equipes capazes de executar planejamentos a longo prazo e que vão permanecer por muito tempo. Algo que jogadoras na liga dos Estados Unidos nem sempre podem contar.
A National Women’s Soccer League (NWSL) ainda é uma liga instável, e dessa vez por não possuir tradição histórica no esporte, as norte americanas podem ficar para trás. Quando levamos em consideração que a USWNT vive em constante disputa com a própria federação, é possível ver no horizonte a possibilidade da Europa se tornar a grande referência mundial. Em 2019, já são 3 países europeus nas semifinais.
Essa edição da Copa do Mundo demonstra que as diferenças estão sendo apagadas, pelo menos entre os países comprometidos com o futebol feminino. Resta saber quando vão “acordar” e seguir o exemplo por aqui. Conmebol, CBF, e aí?