Modelo de gestão no futebol feminino, Aline Pellegrino fala sobre responsabilidade de entidades e possível cargo na CBF: “falta ter o convite”

Por Amanda Porfirio

Uma das mais importantes e célebres capitães da Seleção Brasileira de Futebol, Aline Pellegrino sabe bem como se posicionar na defesa do futebol feminino, seja dentro ou fora de campo. Paulistana do município de Tremembé, começou  a vida no esporte aos seis anos de idade, para minimizar um problema respiratório. Deu início à trajetória no futebol profissional aos 15 anos, defendendo a camisa do São Paulo. De lá, passou por vários clubes, incluindo a Seleção Brasileira entre os anos de 2004 a 2013. Após encerrar a carreira e passar pelo comando de algumas equipes como técnica, Aline assumiu desde 2017 a função de diretora do Departamento de Futebol Feminino da Federação Paulista de Futebol (FPF). 

Desde a chegada de Aline na Federação, algumas ações chamaram bastante atenção e mudaram o contexto do futebol feminino nacional. Em junho do ano passado, a FPF realizou a primeira peneira de futebol feminino da história, recebendo cerca de 300 atletas de todo o Brasil e de outros países da América. Em novembro do mesmo ano, o campeonato paulista bateu o recorde nacional de público no futebol feminino. Para a ex-capitã, esses acontecimentos indicam que o trabalho está no caminho certo. “A gente teve momentos de olhar pra trás e colocar no papel tudo que aconteceu. E a gente começa a ver o quanto o crescimento é muito grande, né? E isso traz uma satisfação muito grande e uma confiança de que o trabalho é esse, sabe?”, afirma. 

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Peneira Feminina da FPF (2019) – Foto: Reprodução FPF

Por outro lado, a realidade que a modalidade vive no território paulista, comparada ao cenário nacional, é uma exceção. Das 27 federações de futebol existentes no Brasil, raras são as que têm um departamento, um núcleo, ou sequer uma pessoa que fique responsável pelo Futebol Feminino. Segundo Aline, muitas vezes o argumento financeiro é utilizado como obstáculo. “Porque fica essa coisa de dizer que para desenvolver futebol feminino tem que gastar milhões. Não, não tem que gastar milhões, você tem que ter um bom planejamento” explica. 

Responsabilidade das Federações

Uma das principais funções das Federações de Futebol é a promoção de competições que envolvam a prática da modalidade. Além disso, elas também precisam administrar, dirigir, fiscalizar, incentivar e fomentar a prática do futebol dentro dos locais onde atuam. Sobre essa atuação dentro do futebol feminino, Pellegrino explica que a responsabilidade passa por uma questão de entendimento da constituição brasileira.

“A responsabilidade da federação aqui, na hora que a gente olha, missão, visão e valor, vê desenvolver futebol com excelência. E se a gente tem que desenvolver futebol com excelência, a gente tem que desenvolver futebol para homens e para mulheres.  Dá oportunidade igual. Que é o mesmo que diz nossa constituição”.

Ainda, de acordo com Aline, muitas vezes os problemas que aparecem no caminho são colocados como obstáculo para desenvolver o futebol das mulheres. “É muito fácil você criar um monte de barreira. Ah, mas tem pouco time, tem pouca menina. Aí você coloca um monte de coisa na frente, para que seja um empecilho. Ah mas se tem tudo isso quer dizer que precisa desenvolver. Eu acho que na hora que vêm umas justificativas para não fazer, eu acho que seria exatamente o contrário, são justificativas para mostrar que precisa fazer e que precisa desenvolver”, defende. 

O compromisso com o desenvolvimento do futebol feminino é uma das bandeiras mais defendidas pela diretora do departamento feminino da FPF. Analisando o contexto do Brasil, Aline entende que é necessário criar pontos focais em todas as federações, com pessoas que possam ser o elo de comunicação entre clubes e federações, e para isso, não precisa ir muito longe ou gastar muito. Um dos caminhos seria contratando pessoas que conhecem a modalidade e têm interesse em ajudar. “Quantas pessoas espalhadas pelo Brasil, ex-atletas, mulheres, homens, que passaram pelo Futebol Feminino, não tem esse interesse hoje, de dar uma consultoria? A pessoa não precisa tá ali registrada na carteira de trabalho, recebendo salário. Vamo fazer com que a pessoa dê ali uma consultoria uma vez por mês, minimamente”, aconselha. 

Crise na pandemia 

Com a suspensão de atividades em meio a pandemia do novo coronavírus, a Federação Paulista, bem como todas as federações do país, precisaram se replanejar com seus campeonatos durante o ano de 2020. O Futebol Feminino sentiu bastante o impacto, e uma discussão se levantou acerca da sobrevivência da modalidade pós pandemia.

Em relação a esse assunto, Pellegrino acredita que a modalidade, além de sobreviver, poderá retomar o desenvolvimento esperado após a copa de 2019. “Parece que o pessoal quer que a nuvenzinha preta fique apenas sobre o futebol feminino. E é lógico que não é assim [..] O problema não é a pandemia, o problema é a falta de gestão. É o quanto aquilo era realmente bem feito, ou era só feito e as coisas iam acontecendo de maneira que quem não tinha um trabalho sério, vai sofrer mais, com certeza. [..] Mas acredito que o futebol feminino vai passar por 2020”.

Comando na CBF

Em junho deste ano, Marco Aurélio Cunha anunciou a saída da Coordenação das Seleções Femininas da CBF. Desde então, as redes sociais da entidade foram invadidas com mensagens pedindo a contratação de Aline Pellegrino para o cargo, que até o momento não foi ocupado. 

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Aline na Peneira feminina da FPF (2019) – Foto: Reprodução FPF

Sobre os pedidos por seu nome, Aline diz ser positivo e resultado do trabalho na Federação, que reverbera não só em São Paulo, mas em todo o país, e brincou alegando que tem um Fã Clube que ainda não conhece na internet. Questionada se aceitaria o cargo, foi incisiva.

“É uma questão de precisar ter um convite. Precisa ver, sentar, com o diretor Reinaldo e conversar. Então, neste momento, não tem nada nesse sentido”, revela.

 Por enquanto, Aline Pellegrino está focada no replanejamento das competições da Federação Paulista. O Campeonato Paulista Feminino tem a previsão de iniciar em meados de setembro, em formato menor do que o idealizado no início do ano. Sobre o investimento das Federações em relação ao Futebol Feminino, a eterna capitã deixou um conselho. “Eu acho que as federações e os clubes, na hora que olhar para o Futebol Feminino, você tá agregando mais valor a sua marca, você tá passando a conversar com metade da população que somos, mulheres. Acreditem, eu acho que vocês podem se surpreender com o resultado que o futebol feminino pode trazer para entidade”. 

 

Jornalista e Profissional de Educação Física. Pernambucana, bairrista por natureza, vivendo a máxima Gonzaguista: “Minha vida é andar por esse país”. Apaixonada por futebol desde que respira. Atualmente vive em São Paulo, e tem como sonho ajudar a conduzir o futebol feminino ao topo. Fora das quatro linhas, gosta de ler, pedalar, explorar a natureza e é obcecada pela ideia de estar sempre criando algo novo.
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