Depois de quase quatro meses de indefinição sobre a volta do futebol feminino no Brasil, finalmente a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) divulgou datas oficiais para as competições. No último domingo (5), o presidente da CBF, Rogério Caboclo, falou para o jornal O Globo que as competições de futebol feminino devem voltar dia 26 de agosto com os jogos restantes da quinta rodada do Brasileiro da Série A1 (Corinthians x Ferroviária, Internacional x Flamengo e Santos x Audax) e dia 29 para todos os clubes, com jogos de portões fechados. Na entrevista, o presidente também afirmou que a Série A2 deve retornar no final de setembro, ainda sem datas definidas. No masculino, a Série A tem início no dia 9 de agosto e as Séries B e C no dia 8.
Se antes não tínhamos nada sobre o retorno do futebol feminino, agora temos datas oficiais. Mas antes de comemorar é preciso também analisar o cenário atual do país. É mesmo a hora do retorno dos campeonatos de futebol no Brasil? De permitir o contato entre jogadoras e comissão técnica e profissionais diretamente ligados a uma partida, como árbitros e gandulas?
Como sabemos, o futebol feminino é o que mais tem sofrido com a paralisação. Algumas jogadoras saindo, clubes perdendo patrocínios e até mesmo o dinheiro da CBF para ajudar as equipes da Série A1 e A2 do brasileiro não foram repassados corretamente, como é o caso do Vitória da Bahia, que teve recentes denúncias de desvios no uso do recurso destinado às jogadoras. Para a modalidade o retorno é significativo, permite a volta do calendário, maior visibilidade, ajuda de custo com campeonatos e chances de mais patrocínios. Porém é preciso questionar as autoridades de que forma isso será feito e quais medidas serão tomadas antes e após os jogos. Para o futebol feminino não é só uma volta aos gramados, existem mais coisas em jogo. É preciso ter responsabilidade para que a decisão não torne ainda pior a situação dos clubes.
Retorno das ligas pelo mundo
Como base de comparação, algumas das principais competições femininas do mundo foram encerradas no meio da temporada, como é o caso da Inglaterra, Espanha, Itália e França – única que encerrou também as competições masculinas. No restante dos países, as federações responsáveis optaram por retornar as ligas masculinas, que estão atualmente nas fases finais.
A Champions League feminina, principal competição entre clubes da Europa tem data para retornar. As fases finais acontecerão de 21 a 30 de agosto, no Estádio San Mamés, em Bilbau e no Anoeta Stadium, em San Sebastián, na Espanha. Nos Estados Unidos e Alemanha, o futebol feminino também retornou.
Em um formato diferente, a National Women’s Soccer League (NWSL), principal Liga dos Estados Unidos, começou dia 27 de junho e terminará dia 26 de julho. Com oito equipes e 25 jogos em um mês, todas as partidas da competição estão sendo disputadas no Estádio do Utah e sem público. O estádio é localizado em Harriman, no Condado de Salt Lake. Atualmente, foram registrados mais de 25 mil casos do novo coronavirus no estado de Utah e mais de 12 mil no Condado de Salt Lake, maior índice do estado. Com um cenário parecido com o do Brasil, o país já registrou mais de 130 mil mortes.
A Alemanha conseguiu finalizar a temporada no último final de semana com a final da Copa da Alemanha, que teve a vitória nos pênaltis do Wolfsburg contra o SGS Essen. As últimas rodadas da Bundesliga foram realizadas de 29 de maio a 28 de junho. Mas diferente do Brasil e dos EUA, a Alemanha tem um total de 198.765 casos confirmados e esperou a diminuição concreta deles para retornar com o futebol. O país chegou a registrar 6.294 casos no mesmo dia, em 28 de março, e agora registra desde o começo do mês de julho uma média de 385 casos por dia.
Diferente da Alemanha, os números do Brasil parecem estar longe de começarem a diminuir. O pico de novos casos em um só dia foi há menos de um mês, no dia 19 de junho, com 54.771 registrados. Um dia antes, o futebol voltou no Rio de Janeiro, com a partida entre Flamengo e Bangu pelo Campeonato Carioca.
O Brasil registrou mais de 69 mil mortos pela Covid-19 e tem mais de 1.7 milhões de casos confirmados até o momento. Não há testes suficientes para testar toda a população e para os jogos, será preciso realizar testes em todos os envolvidos para afastar possíveis contaminados. O futebol feminino, diferente do masculino, não possui salários altíssimos e muito menos todas as jogadoras têm planos de saúde inclusos no contrato.
Mas além de pensar somente nas consequências da volta do futebol, é necessário observar o que está acontecendo ao redor. Porque é considerada tão importante a volta do futebol? Para não perder o calendário? Para ajudar os clubes? Mas e as pessoas que perdem familiares todos os dias, os hospitais lotados e a falta de responsabilidade de quem ainda não respeita o isolamento social? Jogar e/ou assistir futebol importa mais que tudo isso?
São perguntas que conflitam com a paixão do brasileiro pelo esporte, e a responsabilidade que a modalidade tem fora das quatro linhas. Afinal, é isso que diz a frase tão repetida pelos milhões de torcedores e torcedoras do Brasil: é muito mais que futebol!
*Dados da reportagem coletados até 09/07/2020 (Fontes: Organização Mundial da Saúde, Ministério da Saúde e The New York Times).